Coloridos Flambados

O supermercado estava vazio naquele dia. A não ser por algumas famílias que faziam sua compra matinal. Algumas crianças corriam pelos corredores, enquanto outras passeavam com os pais pedindo cada item em cada estante, principalmente os itens que detinham mais cores. Perto de algumas prateleiras de biscoitos, uma criança escolhia seu biscoito favorito. "Coloridos ou arco-íris?", ela se perguntava.

No outro lado da cidade - 4 horas da manhã e três dias antes - seu Ariovaldo abria os olhos para mais um dia de vida. Seu pequeno quarto feito de tijolos sem reboco e um teto de amianto o protegia do sereno da noite. Levantou de sua cama de madeira corrida sem colchão e foi até o pequeno tanque de água da chuva, acumulada através dos buracos da telha, localizado do outro lado do cômodo ao lado do vaso sanitário. O chão estava sujo em várias camadas de poeira e restos de comida. Enquanto andava, Ariovaldo sujou seus pés descalços, porém pisou sem ver nas mesmas marcas que fazia todos os dias ao levantar. Chegou no tanque e pegou um pano velho, desbotado e furado o qual mergulhou na água parada do tanque. Começou a passar pelo corpo se lavando com um lado do pano e se enxaguando com o outro. Terminou seu banho e vestiu o uniforme da fábrica. Saiu de casa e foi trabalhar.

"Acho que vou levar arco-íris mamãe", a criança finalmente escolhera. Ela correu até os pais e colocou no carrinho de supermercado. "Posso comer agora mamãe?". Sua mãe se virou para ela e disse que não, apenas quando comprassem o produto.

Não era um dia comum, algo estava mais vazio do que costumava ser, aonde antes tinha um motivo, hoje nada existia. Ariovaldo olhou para o forno sendo aquecido com carvão, parecia um dia comum, mas não era. Algo havia mudado, ele olhou para o céu e para suas mãos, olhou à sua volta e, de súbito, ele entendeu.

"Agora posso comer o biscoito mamãe?", a menina pedia por seus biscoitos sentada no banco traseiro do carro. Os pais, sentados na frente disseram que sim enquanto o carro seguia rumo a casa da família.

"Alguém viu o Ariovaldo?", o supervisor perguntou a todos. Porém ninguém havia visto ele. Faltavam três dias para o fim do mês.

No fim do mês notaram que Ariovaldo estava a três dias ininterruptos na fábrica. Checaram as instalações, nada encontraram. Checaram as câmeras e observaram quando ele pulou no forno de biscoitos.

O telefone do pai da criança tocou.

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